quarta-feira, 24 de junho de 2015

Os pássaros


OS PÁSSAROS

Acreditava-se que os pássaros seriam emissários de boas notícias. Talvez porque lembrassem os pombos-correios que cortavam o céu trazendo as boas novas.

Minha vó tinha uma casa bem espaçosa, em Livramento. Ela deixava as janelas de um amplo corredor sempre abertas porque podia ver os pássaros, pousando por perto, tanto dentro como fora da casa. Nas janelas havia miolo de pão que eram deixados para eles e sempre na mesma hora.Também podia se tratar de mais uma das tantas superstições do dito popular.

O fato é que minha avó ficava sorrindo pela casa ao ver os pássaros pousarem, pouco a pouco, em seu trajeto diário, nos corredores da casa ou nos pátios, por onde circulava para recolher os ovos, as frutas e hortaliças. Pedia que os filhos e netos caminhassem lentamente para não espantar essas aves, quando surgiam em algum canto. E vovó contagiava a todos. E passávamos a esperar a boa notícia do dia, cada um a sua. De qualquer modo a esperança de um dia feliz já nos fazia mais humanos. Era como se os pássaros e seu canto ficassem no nosso inconsciente transformando o cotidiano e amenizando nossas carências.

E ouvíamos vovó anunciar,pelas manhãs:

-Levantem e venham ver as andorinhas!

E passado o verão vovó ficava pensativa, junto à janela, porque o bando de andorinhas não iria permanecer nas manhãs ou madrugadas de outono, já mais frias.

Os pardais ganhavam sobras de arroz que eram deixadas num prato especial, na área dos fundos.

Quando a velha casa foi reformada, os andaimes permaneceram mais tempo e causaram estranheza. Então vovó explicava para os curiosos de plantão:
-Há ninhos nos buracos e estamos esperando...

E esperava, na verdade, que chegasse o inverno quando não havia mais ninhos.

E na casa da chácara minha vó ensinava aos seus netos:

- Não quero ver bodoque e nem quero que mexam nos ninhos.

Mas, minha tia Thereza percebeu que os passarinhos atacavam as figueiras e bicavam os figos. E para evitar esse ataque ela passou a levantar muito cedo para colhê-los .Com eles eram feitas saborosas compotas em caldas douradas. 

A plantação de árvores, na chácara, fez com que aumentassem o número dos comilões.

A pomba-rola, o bem-te-vi, o sabiá, o papa-laranja, o beija-flor os pelinchos devastadores de caquis, o tico-tico eram frequentadores do pomar da chácara de vovó.

Sempre que lembro da casa da cidade me deparo com saudade dos pássaros que vovó tanto apreciava. Quando acordava já abria portas e janelas por onde os via descansar e buscar o miolo do pão dormido.

Mas de quem me lembro com saudade é do canarinho da terra, o primeiro a chegar, derramando seu concerto de trinados amorosos, com requintes de grande cantor, a exibir-se em algum peitoral de janela, no esplendor da terra morna. 

E me alegro ao pensar nesses pássaros encantadores que surgiam nos verões para embalar a saudade do núcleo familiar.

E falo com propriedade se disser, que de certa maneira,sem nunca possuir gaiolas,sempre tive a alegria de ver pássaros dentro da casa de minha avó querida: Dona Glória.


Katia Chiappini


quinta-feira, 18 de junho de 2015

Comunhão Total - Entre o céu e a terra



COMUNHÃO TOTAL - ENTRE O CÉU E A TERRA ( Contos de Paz )
Por Juliano Paz Dornelles

O Guerreiro resolveu consultar o Caboclo a fim de saber o que estava acontecendo. Sabia estar no caminho certo na grande maioria do tempo. Mas em alguns momentos, algo lhe chamava ao passado. Contudo, a missão assumida pelo guerreiro consiste em ir pra frente. Em direção ao futuro o qual idealiza. Construindo a realidade como seus ancestrais Mestres Construtores fazem desde sempre.

Tomando um café, em uma manhã de segunda-feira, conversavam com os espíritos da terra. O Caboclo contou ao Guerreiro que sua determinação incomodava algumas pessoas próximas. Principalmente no ambiente profissional. Alguém queria derrubá-lo. Forças Wiccas orando a um 'Santo Católico Humano Marrom'.

Apesar desta surpresa, o Guerreiro e o Caboclo, ao chamarem tais entidades à conversa, descobriram que, no fundo, ambas se mostravam apreensivas. E assumiriam o compromisso de lutar ao lado do Guerreiro. Sendo que o tal 'Santo Marrom' se encontrou 'Branco' no próprio Guerreiro. Conforme revelou o Caboclo.

Mas o que havia acontecido. Perguntou o Guerreiro. Há mais ou menos dez anos, na passagem do Guerreiro pela Guerra, em uma experiência como General Cavaleiro de Cristo, as mesmas pessoas se sentiam incomodadas. Não entendiam porque o 'Menino' se encontrava 'Montado sobre si Mesmo', como 'Guerreiro, Cavalo e Cavaleiro Branco' ao mesmo tempo. E que naquela ocasião também tentaram derrubá-lo. Contudo, o Guerreiro permanece em pé até hoje.

O relato do Caboclo fez lembrar uma passagem de um longo tempo pelo inferno. Na qual o guerreiro, ao esvaziar-se e desdobrar-se em vários entes, teve de levantar o cavalo nas costas para se tornar um novamente. Fazendo  algo semelhante com os demônios e espíritos infernais que o perseguiam. Tratando-os e ajudando-os a se tornarem espíritos de luz.

A tentativa de levar-lhe foi feita da seguinte maneira. Mostraram-se alguns espíritos do lado externo. Imitando as entidades que foram vistas com o Guerreiro. Pretos, Exús, Cavalos e outros entes. A tentativa do inimigo era que o Guerreiro confundisse tais entidades externas com as quais têm em si mesmo. Uma tentativa de aquisição dos mesmos espíritos ao negar o Guerreiro.

O fato é que, naquela ocasião, em uma cerimônia real e  imaginária ao mesmo tempo, o guerreiro havia se esvaziado por completo. Os entes com os quais trabalha, permaneceram guardados de forma oculta no subconsciente. Apesar disso, o guerreiro teve sérios problemas relacionados à fé. O que lhe fez passar por dificuldades e ter problemas no mundo dos relacionamentos. Familiares, amistosos e profissionais.

Sabendo deste detalhe, após uma segunda tentativa do mesmo tipo, o Guerreiro, ao desmontar o trabalho, descobriu que seus verdadeiros entes permanecem em si mesmo (no próprio ser Guerreiro). E que, aqueles os quais se presentam no mundo exterior,  desejam, de fato, juntar-se ao Guerreiro.

Desta forma, o Guerreiro formalizou o convite aos entes no testemunho do Caboclo: 'Vocês estão convidados a juntar-se a nós para que juntos possamos lutar na construção de um mundo melhor a partir da mudança de atitude e da transformação do ser'.

A partir daquele momento, sabendo que tudo está no ser, o Guerreiro entendeu que tens de assimilar tudo o que lhe for apresentado no mundo externo. Incorporando ao âmago do ser interior. Da mesma forma que tens, também, de exteriorizar, em sua produção cultural, algumas coisas que cria dentro de si e podem ser úteis ao mundo.

O Guerreiro se encontrou longe de ser o mesmo a partir daquele momento. Contudo, o mesmo e o outro; O igual, o semelhante e o diferente; Agora foram assimilados em comunhão total. A ata foi selada pela conversação oculta nas entrelinhas. O próprio Caboclo, os Pretos e os Exús, se tornaram um com o Guerreiro.

Juliano Dornelles

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terça-feira, 9 de junho de 2015

Segredos

Os deuses chegaram ao mago e disseram-lhe: ‘Temos um segredo. E você foi escolhido pra guardá-lo. Queremos saber se estás pronto pra recebê-lo. Pense e nos diga quando souber a resposta’

O mago consultou os oráculos de seu universo intrapessoal. E lhes foi revelado que: ‘A forma mais segura de guardar um segredo é ocultar de si mesmo, até que se revele por si só, com o tempo, na hora certa’

O mago direcionou-se aos deuses e disse: ‘Estou pronto’

'Queres saber o segredo?' - Perguntaram-lhe os deuses.

'Prefiro mantê-lo oculto' - Respondeu o mago. Assim fez-se merecedor do presente divino.


Juliano Dornelles

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Consulta espiritual virtual

Eram duas da tarde. Há alguns anos. Hora da sobremesa, como costumo dizer. Entrei no web-chat a fim de fazer novas amizades. Conheci uma garota e começamos a teclar. Entrei como MASTER MÍDIA. E ela como CIBER GIRL.

MASTER MÍDIA: - Olá querida. Tudo bem com você ? Topas teclar ?

CIBER GIRL: - Bem sim. E vc ?

MASTER MÍDIA: - Estou ótimo. Um dia light hoje no trabalho. Teclas de Porto Alegre mesmo ?

CIBER GIRL: - Grande POA. - Mas estou em uma Lan House do centro de Porto Alegre agora.

MASTER MÍDIA: - Legal. Estás livre então ? Qual sua idade ?

CIBER GIRL: - Sim, estou. Tenho 30 anos. E vc ?

MASTER MÍDIA: - Tenho 33. Estou em busca de uma amizade. Toparias me conhecer ?

CIBER GIRL: - Até toparia. Mas estou saindo de um relacionamento recente. Um cara que conheci no chat. Investi no cara. Gostava dos momentos a dois. Mas depois me sentia carregada. Uma tristeza. Se conhecer uma benzedeira me indica. kkkkkkk

MASTER MÍDIA: - Trabalhei com religião um tempo. Posso trabalhar o seu corpo se me permitir. Venha me visitar.

CIBER GIRL: - Fico meio insegura. Os caras da internet só querem sexo. Mas sexo é bom. Aí é que está o problema. Só que depois me sinto mal. Como um instrumento descartável.

MASTER MÍDIA: - Imagino como se sente. E era exatamente neste ponto que gostaria de chegar. Senti tua energia agora. Esta pesada mesmo.

CIBER GIRL: - Sim estou. Estou carente. Preciso de colo.

MASTER MÍDIA: - Toparias me visitar ?

CIBER GIRL: - Hoje não. Quem sabe outro dia.

MASTER MÍDIA: - O que pode fazer de imediato é tomar um banho com sal grosso. Evite procurar contatos que têm interesse apenas carnal. Tente ir ao encontro daqueles que lhe dão carinho. Lhe tratam com educação. E são gentis.

CIBER GIRL: - Sim. Estou precisando disso.

MASTER MÍDIA: - Lembre que o sexo é igualmente gostoso com carinho, respeito e boa conversa. Há coisas tão boas quanto uma puxada de cabelo e tapas na bunda. Se resolver venha me visitar.

CIBER GIRL: - Ok. kkkkk

MASTER MÍDIA: - Gosto da pegada forte em alguns casos, porém sinto que você está precisando de carinho. Qualquer coisa me liga (51) 9501-3***. Bjs querida. Melhoras aí.

CIBER GIRL (saiu da sala)

Após esta rápida conversação, até mesmo minha fome (ou vontade de comer) havia passado. Senti que havia dado início a uma boa ação. Então fui tomar uma ducha. Pois de fato fiquei mesmo carregado. Enquanto estava no banho, o telefone tocou: ‘Oi Master. É a Ciber’.

Senti que aquela seria uma tarde memorável.


Juliano Dornelles
Membro do Partenon Literário
Site pessoal: pazdornelles.com